O torcedor brasileiro já é um apaixonado por natureza — mas desde 2021, ele também virou ativo digital. Foi nesse ano que clubes como Flamengo, Corinthians e Atlético-MG entraram no universo dos fan tokens, criptoativos que permitem engajamento direto com decisões simbólicas do time. E é nesse ponto que surge o jogo da fruta que ganha dinheiro, expressão que parece curiosa, mas encaixa perfeitamente quando se observa como o futebol virou uma mistura de emoção e criptoeconomia.
O caso do Flamengo ajuda a entender o tamanho dessa nova fonte de receita. Um contrato com a Socios.com (Chiliz) prevê retorno total de mais de 140 milhões de reais até 2025 — e já garantiu ao clube royalties anuais de R$15,8 milhões desde a assinatura. Tudo isso, apenas vendendo tokens que custavam, em média, dois dólares cada. O Corinthians e o Galo também surfaram essa onda, vendendo cerca de 850 mil unidades em questão de horas.
Mais do que dinheiro na conta, os clubes conquistaram um canal de marketing direto. A Socios, além de pagar pelas vendas, garantiu presença na camisa de treino, visibilidade nas redes sociais e espaço em propriedades do clube, como a FlaTV. Ou seja, não foi só uma parceria tecnológica — foi um acordo de mídia, engajamento e monetização simultaneamente.
Até as taxas de negociação desses tokens em exchanges rendem para os clubes. Muitos contratos preveem participação nas chamadas “trading fees”, ou seja, cada vez que o torcedor compra ou vende o token no mercado secundário, uma parte volta para o clube. É uma receita recorrente, invisível e — por enquanto — pouco explorada por outros setores do esporte brasileiro.
Escolhendo a Música do Vestiário: Tokens e Participação dos Fãs
Fan token não é ingresso, não é camisa, não é assinatura. É uma espécie de chave digital que abre pequenas portas dentro do clube. Pode parecer simbólico — e é mesmo. Mas esse simbolismo carrega um poder que fideliza: a participação. Torcedores do Flamengo já escolheram a música do aquecimento no Maracanã. Os do Galo batizaram o novo mascote. No Corinthians, decidiram a arte do painel do CT. E tem mais vindo aí.
Claro, tudo isso passa por votação entre detentores dos tokens. E não é preciso ter centenas — basta um para ter direito a opinar. É um mecanismo simples, mas poderoso. Cria pertencimento. Gera identificação. Dá ao torcedor a sensação de estar, literalmente, ajudando a escrever a história do clube. E essa sensação, convenhamos, não tem preço.
Essas ações não vieram para substituir o tradicional sócio-torcedor. Na verdade, elas se complementam. Em alguns casos, até se integram. O Inter-RS, por exemplo, distribuiu tokens como brinde a quem já era sócio. Foi uma jogada inteligente: premiou o torcedor fiel e ainda apresentou o universo digital a quem talvez nunca tivesse se interessado por blockchain.
Em meio a tudo isso, surgem também os colecionáveis digitais — termo que se conecta diretamente a uma nova realidade que vai além do fan token. A CBF, em parceria com a Binance, lançou em 2024 os NFTs do Brasileirão: figurinhas digitais gratuitas com valor simbólico e utilitário. Quem completasse a coleção ganhava prêmios reais, como ingressos e camisas. Nada de promessas vazias — era engajamento com recompensa concreta.
Esse tipo de ação tem apelo forte entre os mais jovens, especialmente a Geração Z. E mesmo quem nunca havia interagido com criptoativos antes se viu resgatando NFTs, votando em enquetes e acompanhando notificações no app da Socios. A tecnologia some em segundo plano — o que fica mesmo é a experiência. A relação emocional. A possibilidade de fazer parte, mesmo que um pedacinho, do que acontece dentro do clube.
Figurinhas Digitais e Prêmios Reais: NFTs no Brasileirão 2024
Em 2024, o Brasileirão não foi jogado só nos estádios — ele também ganhou vida em blockchain. A CBF, em parceria com a Binance, lançou uma coleção oficial de NFTs distribuídos gratuitamente para torcedores. Eles funcionavam como um passe digital com direito a resgatar experiências ao longo do campeonato: ingressos, descontos, brindes e até cursos. Sim, até educação entrou nessa equação.
A mecânica era simples, mas eficiente. A cada rodada, o torcedor podia resgatar um NFT exclusivo do seu clube, totalizando 38 ao longo da temporada. Quem conseguisse completar a coleção ganharia uma versão especial — brilhante, única, e voltada aos verdadeiros “completistas”. Era uma espécie de álbum digital gamificado, só que com recompensas reais no lugar de papel.
Essa estratégia ativou um público que, em muitos casos, nunca tinha mexido com blockchain. Mas o atrativo estava em outro lugar: a experiência. Os códigos eram divulgados nas redes sociais, e o engajamento crescia semana após semana. O Proof-of-Passion, como foi batizado o projeto, ainda incluía memorabilia de jogos e itens autografados como incentivo extra.
Clubes também começaram a explorar suas próprias coleções. O Fluminense lançou NFTs com artes para cada rodada da Série A. Já o Vasco promoveu um leilão beneficente com um NFT de um gol histórico de Roberto Dinamite. A movimentação foi ampla — e ao que tudo indica, longe de ser algo pontual.
Mais do que colecionar, o torcedor passou a viver o campeonato em camadas diferentes. Assistir ao jogo, torcer, resgatar, completar, ganhar. Um novo jeito de se relacionar com o time — e com a tecnologia.
Entre Emoção e Especulação: O Que Fica Para o Torcedor?
Com tanto entusiasmo, era inevitável surgirem algumas dúvidas. Os fan tokens, por exemplo, enfrentaram quedas acentuadas em períodos de baixa do mercado. Em 2022, muitos viram o valor despencar — e junto com ele, parte da empolgação inicial. Afinal, quando o criptoativo do clube perde valor, o torcedor-investidor sente o baque emocional e financeiro.
Em contrapartida, os NFTs gratuitos tiveram aceitação muito mais tranquila. Eles não exigiam investimento direto e ofereciam prêmios reais, o que baixava a barreira de entrada. Era só participar — o engajamento vinha de graça, mas os resultados podiam ser bem tangíveis. E muitos fãs começaram a entender, na prática, o que é um NFT.
Essa adesão espontânea gerou dados valiosos para clubes e patrocinadores. Comportamento de resgate, geolocalização, perfil de engajamento — tudo isso virou ativo estratégico. E mais: abriu caminho para formas inéditas de gamificação e patrocínio. Afinal, marcas querem estar onde o público está — e ele está no digital, interagindo com seu time.
No fim das contas, não se trata só de tecnologia ou finanças. O que está em jogo é uma nova maneira de viver o futebol. Um elo diferente entre torcida e clube, que mistura colecionismo, emoção e inovação. Quem imaginaria que uma figurinha digital poderia se tornar parte da identidade de um torcedor? Pois bem, virou.
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